22.8.09

A Declaração

"Matheus, meu Deus do céu, me desculpa. Logo naquela hora? Meu pai estava na porta, na porta! Eu estava esperando um beijo desde o momento em que entramos no cinema. Eu estava preparada. Aquela hora que a gente ficou junto, sabe? Sozinhos, naquele banco, olhando as estrelas. E você me abraçou. Foi tão lindo. E tudo o que eu mais quero é você. Dane-se a distância, DANE-SE. Eu te amo. Como melhor amigo ou como qualquer outra coisa que você queira ser. Eu não ligo, eu só quero estar perto de você. Só isso. Mas eu acho que você não quer. E eu peço desculpas, acho que te forcei, te assustei. Saiba que a Mel nunca me influenciou, NUNCA. Ela só me ajudou a aceitar um sentimento do qual eu tinha medo. Desde a sexta série! Eu nunca achei que você ia me querer, nem como amiga. Acho que não quer. O que será que você vê em mim? Eu estraguei tudo. TUDO! Não acredito. Sabe qual foi a primeira coisa que eu fiz ao sair do parque? ME ARREPENDER! Eu queria ter te abraçado mais. Te beijado. Nem que fosse só uma vez, só aquela última vez. Você devia ter me avisado! Que tinha medo que eu não te quisesse. Mas era você, ERA VOCÊ que não me queria. Porque eu to chorando?! Foi minha culpa. Minha culpa. Minha culpa. Minha culpa. Minha, minha, minha. Mentira. Foi sua, e eu sou idiota e fico me culpando. Fico me culpando pra achar que você gosta de mim e eu que estraguei tudo. Quer saber? Não te amo mais. Amanhã vou sair com o Guilherme...
Desculpa Matheus. Eu acho que te amo."
A droga do mistério do amor. Nunca consegui desvendar.

12.8.09

O Primeiro Conto de Alice


Com cabelos castanhos e manchas roxas sob os olhos, era Alice. Discreta e desinteressante à vista das outras pessoas. Vivia só, viva dormindo. Não vivia quando estava só, quando dormia, acordava para viver.
Durante o dia, Alice era triste. Cada minuto era uma batalha. Até o sol se por e a lua aparecer no céu. Até chegar a noite.
Entrava em casa correndo, jogava bolsa, mochila ou qualquer coisa que carregasse para os lados. Sem mesmo trocar a roupa, Alice se jogava na cama e dormia.
Assim que fechava os olhos, ela caia em um sono profundo, e logo sonhava. Sonhava primeiro com um céu cheio de estrelas. Ela andava sobre esse céu. Dava três passos para a esquerda, uma estrela à frente, outros dois passos à direita e mais cinco estrelas na direção do sol. Depois ela sonhava de novo, com um lugar novo, belo, onde ela era tudo. E então, ela não sonhava mais. Ela vivia em seu próprio mundo.
Mesmo com 16 anos, Alice não tinha amigos. Era uma velha em corpo de jovem. Lia muito, sabia demais e vivia com a cabeça em qualquer outro planeta, menos a Terra. A Terra era cruel.
Dia após dia, Alice esperava ansiosa a noite chegar. Não prestava atenção nos outros ao seu redor, apesar de sua vontade de ter alguém com quem dividir seu mundo noturno. Mas todos gozavam de sua sonolência, e ela aguentava. Até que seus colegas a fizeram chorar. De um modo frio, enviavam diariamente cartas para Alice. Ela as lia, respondia, e aguardava a próxima. Adorava ler as palavras do amigo anônimo. Alice começou a criar esperanças, alguém podia gostar dela! Mas não. No dia em que combinaram de se encontrar, a menina ficou horas esperando-o numa praça, e ao final do dia apenas viu os meninos de sua classe. Rindo. Aí ela chorou.
Chorou e correu para casa. Se deitou na cama e fechou os olhos com força, querendo ir logo para seu mundo, onde alguém poderia consolá-la, mas Alice errou o caminho.
A tristeza era muito, maior ainda era a pressa de chegar ao seu destino. Pouca era a concentração, e ela caiu no mundo errado.
Uma grande placa dizia “Terra do Nunca”. As letras pareciam tristes. Tudo parecia feito de pedra, nada se movia. Pessoas, plantas e até mesmo o ar parecia uma estátua.
Alice começou a andar pelo lugar, tentando entender alguma coisa, encontrar algum ser vivo. Andou por horas, passou por florestas cinza, cidades cinza, rios cinza. Tudo feito de pedra.
Viu belas paisagens, apesar da pouca (ou nenhuma) vida. Campos cheios de flores, animais correndo sem sair do lugar, casais sentados sobre a relva. E nada tinha movimento ou cor. Nem mesmo a lua, que continuava parada, como se olhasse na cara de Alice e dissesse:
-Menina só, menina tola. Procura algo vivo e rosada numa cidade cinza e morta. Como é tola, tola...
Alice tampou os ouvidos, procurando o silencio. A lua não parava da falar. Alice não queria ouvir. Queria sair daquele lugar, queria acordar logo. E... E se ela não acordasse!? Alice pensava, aflita. Tudo estava mais real do que sempre esteve. Tudo estava mais real do que durante o dia.
-Ei, ei menina, calma. Você ta gritando alto demais. Pode acordar alguém.
Ela arregalou os olhos. Por um instante, Alice se sentiu feliz. Uma pessoa falava com ela! Mas essa felicidade não durou muito. Assim que se virou, ela se deparou com um pequeno ser, mas não uma pessoa. Tinha olhos grandes e asas. Alice se assustou, recuou um pouco. Quem ou o que quer que aquilo fosse poderia fazer coisas horríveis com ela. Ela tinha medo.
-Quem é você? O que quer? – Alice falou com um fio de voz.
-Quem é você? O que quer? – Respondeu o ser.
Alice ficou quieta, não se atrevia a fazer mais nenhum som.
-Está bem, eu respondo primeiro. Sou Arya. Te vi e fiquei curiosa. Só. Sua vez.
Hesitando, a garota respondeu.
-Sou Alice, e quero saber o que exatamente é você, e o que exatamente é esse lugar.
-O que sou eu? Que bobagem. Sou uma fada, oras! Nunca viu uma de nós por aí? E este lugar – Disse a fada, gesticulado ao seu redor – É a terra do nunca.
Alice fez cara de confusa, imitada por Arya. A fada pareceu ler seus pensamentos, e se colocou a explicar o porquê das estátuas.
-Na verdade são pessoas. Sempre que a lua aparece no céu, todos devem voltar à pose original e assim ficar, até o sol nascer.
-E porque você não fica assim?
-Alice, não está prestando atenção no que digo? Sou uma fada. Alias a única por aqui. Essas coisas bobas não me influenciam, esse lugar me cansa.
Alice assentiu. A fada continuou a falar e Alice assentia. Não entendia muita coisa, mas assim que Arya se levantou e começou a andar Alice a seguiu.
Juntas, andaram por horas dentro de um bosque. A fada falava enquanto a menina concordava, sem realmente prestar atenção. Alice tinha uma fome voraz por aquela bizarra paisagem. Quanto mais andavam, mais ela queria ver. E tanto andaram que um raio de sol saiu por de trás da montanha e tocou um galho da mais alta e mais velha das árvores do bosque.
-Ah, ah... Venha cá, menina sem asas. Tenho que lhe dar uma coisa.
Arya empurrou Alice na direção do velho tronco, que estendeu um galho e deixou que uma pedra reluzente, meio molhada, caísse nas mãos da menina.
-Essa pedra... Essa pedra. Me esqueci. Perdão menina, perdão.
A árvore voltou ao cinza. O sol se pôs no horizonte. A fada sumiu. E Alice não acordou.