4.3.09

O Bilhete - cap. 5

Tudo já estava muito escuro. Deviam ser 2 da manhã.
O hotel em que Amadeo jazia deitado já tinha desaparecido de vista, mas eu ainda estava muito longe de casa.
Eu estava caminhando há horas. Minha cabeça girava, e eu não chegava a lugar nenhum. No meu divertimento com o garoto, esqueci quem ele era. Esqueci quem era eu mesma. Acho que por isso que na hora me senti ótima ao matar.
Mas depois, sem carros passando na rua e nenhum barulho de vida alheia, eu me coloquei a pensar.
Eu tinha tirado a vida de alguém. De alguém que nem era um alguém direito ainda. Que ainda tinha muito para aprender, vivenciar. E eu que tinha roubado tudo aquilo dele.
Roubar. Acho que essa é a palavra perfeita pra isso, pra tudo. Roubar é a pior coisa que a gente pode fazer. Eu tinha roubado a alma de Amadeo, a essência da vida dele, e agora estava carregando-a nos braços. Eu estava carregando a prova de um assassinato, qualquer idiota conseguiria perceber que eu tinha matado alguém.
Naquele momento, me dei conta de como era estúpida. Destino era o culpado de tudo, tudo. Ele estava me manipulando, colocando coisas na minha cabeça, e eu estava fazendo o papel da boba que fazia tudo.
Vomitei. Já estava na hora de vomitar mesmo. Vomitei meu jantar, o vinho, as palavras e todo o meu ódio. Vomitei minha razão. Destino ia se ver comigo.
Corri o mais rápido possível. Tinha que chegar em casa.
Coloquei a chave na maçaneta com um pouco de dificuldade. Estava tremendo de mais. Antes de abrir a porta, me dobrei sobre os joelhos para recuperar o fôlego. Quando levantei a cabeça, a porta já estava aberta.
Destino estava sentado em um banquinho, me olhando com um sorriso cheio de fúria. Bateu palmas me encarando. Eu podia sentir o cheiro da raiva dele.
Certo, tudo bem, eu pensei. Vou acabar com tudo agora, largar esse trato e voltar a ser como era antes. Qualquer coisa, Amadeo teve uma overdose.
-Destino, eu realmente preciso de te falar uma coisa.
-Eu sei. Eu também tenho que te falar algo. Mas eu tenho todo o tempo do mundo, então diga, vá em frente. O que você realmente precisa me falar? – Ele me respondeu com um tom zombeteiro, como quem já sabe o final da piada.
-Eu não quero mais fazer nada disso. Não quero vingança. Já to bem assim, Zach que se dane.
-Você quer me largar então? – Eu assenti– E como você pretende fazer isso, se as marcas do nosso pequeno acordo já estão no seu corpo?
-Você pode me fazer voltar ao normal, eu não ligo. Pode levar quanto dinheiro quiser também-
O banquinho voou e bateu na parede, fazendo um barulho ensurdecedor. Não fui capaz de terminar a frase, Destino começou a berrar.
-DINHEIRO? Você acha que EU preciso de dinheiro? Não, menina, não preciso de nada! Você já disse que sim, não tem como voltar atrás.
A voz dele ecoava por todos os lados. Todos os vizinhos deviam estar escutando. Aquele homem era louco, eu tinha certeza. Mas o Louco me agarrou pelos braços e começou a falar grosso, me encarando. Só que ele não tinha olhos. E eu me assustei.
-Vim aqui para lhe dar as primeiras instruções. Se você não fizer as coisas como estou pedindo, então não fará mais nada. Tenho certeza de que haverá um espaço no inferno para você, caso eu precise.
Eu não queria que ele roubasse a minha vida. Não estava pronta pra isso. Assenti novamente.
Como qualquer filme de terror que se preze, Destino deveria desaparecer numa nuvem de fumaça e deixar as instruções escritas em sangue na parede, ou em algum código difícil.
Mas isso não era um filme. Era a minha vida acontecendo. Ele usou a porta da frente, e antes de sair enfiou um pedaço de guardanapo entre os meus dedos. Bateu a porta com muita força. Fiquei surpresa com a resistência da minha casa, tinha certeza de que ela iria desabar.
Abri o pequeno papel. Aquele homem realmente era um porco. Haviam manchas de gordura e restos de comida se misturando com as letras de uma pequena palavra naquele guardanapo. Grudei-o na geladeira e fui me deitar. Precisava dormir.
“Treine, treine, treine”. Milhares de vozes estavam sussurrando isso na minha cabeça.
Destino queria que eu treinasse. Eu não queria treinar. Mas precisava.
Não consegui dormir naquela noite e nem nas seguintes. Acho que isso me ajudou a enlouquecer. Também não tinha a menor ideia de como treinar, mas acabei usando a criatividade.
Arrumei um emprego na veterinária. Eu não tinha que fazer muita coisa, apenas matar os animaizinhos que não tinham saída. Também passei um certo tempo num açougue, aprendendo a usar uma faca.
Com o pequeno salário que ganhava, ia ao parque de diversões e treinava tiros. Eu era simplesmente ridícula.

4 comentários:

Anônimo disse...

erika , eu te amo . nem tenho palavras pra falar o quanto vc é essencial na minha vida .


TE AMOOOOOOO

ana /\

Gabih, ou como preferir me chamar. disse...

aiai. continue logo u.u quer me matar do coração? xD

Gárgola disse...

Alice estava esperando como você ia desenvolver a história depois do assassinato, era realmente uma tarefa difícil. Pensei até que era um beco sem saída, mas minha grata surpresa foi que você conseguiu escrever um capítulo redondo, para mim, o melhor de todos até agora.
Continuarei com o olho vivo até o próximo capítulo. Está emocionante...

beijos primaverais (por aqui o frio esta indo embora e os pessegueiros estão floridos)

Gabih, ou como preferir me chamar. disse...

Eu não posso esperar pra ingulir as palavras do proximo capítulo... sinceramente, ela não é ridicula, ela é confusa .0. eu nao conseguir a entender. / AHH! CONTINUEI A MINHA HISTORIA, ELA NAO É MELHOR QUE A SUA MAS LEIA \O\