Nicolas ganhou de mim três vezes. Eu ganhei cinco.
Eu não sabia o nome do jogo. Tínhamos que acertar a bola em um alvo, correr com ela nas mãos, pular, desviar e desarmar o outro. Parecia uma luta dançada. Ou uma dança lutada. E eu era boa nisso.
Nicolas fechou a cara e se dirigiu para a ducha nos fundos da casa. Disse que ia tomar um banho para se refrescar, que estava suado. Mas eu sabia que não era isso. Não completamente isso. Sabia que ele odiava perder, que precisava relaxar. Homens.
Ele saiu e eu fiquei parada. De pé, tentei esperar o tempo passar. Mas eu precisava me mexer.
Acabei me convencendo de que toda a energia de Nicolas tinha passado para mim. Corri mais um pouco, tentei alcançar os últimos raios do sol que se punha. Queria guardá-los só pra mim. Mas quando abri as mãos, apenas estrelas escorriam pelos meus dedos.
Voltei para casa vestindo minhas roupas encharcadas de suor e um cheiro horrível. Sem pensar se Nicolas ainda estava lá, corri para a ducha. Nunca precisei tanto de um banho.
Comecei a me despir antes mesmo de chegar aos fundos. Pretendia me deixar de molho até o dia seguinte, e minhas roupas por mais outross três.
Já estava com metade do corpo a mostra.
-Não temos mais nenhum pudor nessa casa? –Escutei sua voz rouca às minhas costas, em meio a leves risadas que inutilmente tentava esconder. Eu conseguia ver a cara de Nicolas falando isso, não precisava me virar para ter certeza. Mas me virei.
Ele olhou para mim com os olhos arregalados. Fez cara de crianças, fingiu se esconder e depois abriu um de seus mais belos sorrisos. E tentou me abraçar.
Desviei. Nicolas estava só de toalha. E eu não gostava de pessoas me tocando. Inclusive quando eu não vestia nada.
-Saia da minha frente Nicolas, preciso de água. –Falei, enquanto o empurrava para o lado, tentando entrar no pequeno quarto com o chuveiro.
Fechei a porta com pressa, tranquei-a e corri para o banho.
A água estava gelada. As gotas caiam curiosas em minha pele, me cortavam com a baixa temperatura.
-Não vai querer saber minha historinha? Ou o trato já esta desfeito e você jogou sem querer algo em troca? Aposto que está morrendo de curiosidade.
Eu queria saber. Eu estava louca, morta, com um universo e meio de curiosidade de remexendo dentro de mim. Não queria que Nicolas percebesse.
-Claro que quero saber.
Ele estava do outro lado da porta. Devia estar forçando a fechadura para entrar, eu tinha certeza de que ele não gostaria de ficar do lado de fora. Não queria que ele entrasse. Poderia contar de onde estava.
-Não vai abrir a porta?
-Não. Conte-me de onde está. E ande logo, conte enquanto estou de pé, pois já já me deito.
-Já que quer assim... –Ouvi passos se distanciando. Como era sacana.
-Pare de suspense Nicolas. Sei que ainda está com a orelha colada na porta.
Ele soltou um palavrão abafado e depois riu alto para disfarçar.
-Vejo que está cada vez mais esperta, querida Íris. Acredito que grande parte dessa esperteza seja de minha influencia.
-Sendo sua ou não, não ligo. Apenas me conte o que aconteceu.
-Está bem. Mas antes eu arrumaria algum lugar para sentar. Você está prestes a ouvir uma longa historia. Cuidado com os pesadelos, minha pequena.
Sentei no chão, sob a água. As gotas quicavam em meus ombros, molhavam meu cabelo. Faziam um som infantil. As palavras se derretiam, amargamente doces. Eu chegava a sentir o gosto. Adorava historias.
-Destino chegou cedo hoje, bem antes de você acordar. Ainda havia lua no céu - Assim Nicolas começou, narrando cuidadosamente sua historia.
-Quando abri os olhos, acordado por um frio repentino, vi seu vulto negro sentado no chão. Demorei para levantar-me, pois você me abraçava, e eu não queria te acordar. Mas como você me segurava forte! Levantei-me e fui em direção de Destino. O ar chegava a fazer mais barulho que nossas vozes em meio a uma conversa.
“Em um momento, quase começamos a gritar. Destino e eu não nos entendemos muito bem, devíamos estar discutindo por alguma bobagem. Tão bobagem que nem me lembro agora. Quando começamos a levantar a voz, ele me segurou pelo braço e me puxou para fora da casa. O ar me cortava. Andamos durante bastante tempo, rumo à uma floresta. Destinou usou um caminho difícil, dando voltas e andando rápido, fazendo com que eu não me lembrasse de como voltar.”
-Então você não foi dar uma volta?
-Deixe-me terminar, Íris!
“Certo. Bem, depois de tanto andar, acabamos chegando a uma clareira na floresta. Destino me olhou com ódio, e me bateu uma primeira vez.
“Sempre imaginei Destino como um velho. Mas seus punhos eram duros como aço, e estavam mais frios do que a noite, me cortavam. Ardiam e queimavam. Nunca um soco doeu tanto. E era uma dor que não acabava.
“Começou um longo sermão. Destino adora falar, adora que prestem atenção em suas palavras difíceis e em seus enigmas.
“Primeiro ele me disse coisas sem sentido, sobre leis, contratos, acordos. Falou que eu estava contra tudo e todos, que eu era um rebelde. Eu não entendia nada. As palavras não faziam sentido, e eu ainda estava tonto de dor.
“Foi então que olhei diretamente para Destino, e prestei atenção em sua figura.
“Ele estava sem capa Íris, sem nada. Eu pude ver seu corpo branco e enrugado. A pele fina, como papel. Eu podia jurar que, com o minimo movimento, ele se ragaria. Mas ainda assim parecia esculpido em pedra.
“Destino me olhou, mas eu já não prestava atenção. Me bateu novamente, eu sentia mais dor. Parecia que Destino ia arrancar meus braços.”
Eu não sabia o nome do jogo. Tínhamos que acertar a bola em um alvo, correr com ela nas mãos, pular, desviar e desarmar o outro. Parecia uma luta dançada. Ou uma dança lutada. E eu era boa nisso.
Nicolas fechou a cara e se dirigiu para a ducha nos fundos da casa. Disse que ia tomar um banho para se refrescar, que estava suado. Mas eu sabia que não era isso. Não completamente isso. Sabia que ele odiava perder, que precisava relaxar. Homens.
Ele saiu e eu fiquei parada. De pé, tentei esperar o tempo passar. Mas eu precisava me mexer.
Acabei me convencendo de que toda a energia de Nicolas tinha passado para mim. Corri mais um pouco, tentei alcançar os últimos raios do sol que se punha. Queria guardá-los só pra mim. Mas quando abri as mãos, apenas estrelas escorriam pelos meus dedos.
Voltei para casa vestindo minhas roupas encharcadas de suor e um cheiro horrível. Sem pensar se Nicolas ainda estava lá, corri para a ducha. Nunca precisei tanto de um banho.
Comecei a me despir antes mesmo de chegar aos fundos. Pretendia me deixar de molho até o dia seguinte, e minhas roupas por mais outross três.
Já estava com metade do corpo a mostra.
-Não temos mais nenhum pudor nessa casa? –Escutei sua voz rouca às minhas costas, em meio a leves risadas que inutilmente tentava esconder. Eu conseguia ver a cara de Nicolas falando isso, não precisava me virar para ter certeza. Mas me virei.
Ele olhou para mim com os olhos arregalados. Fez cara de crianças, fingiu se esconder e depois abriu um de seus mais belos sorrisos. E tentou me abraçar.
Desviei. Nicolas estava só de toalha. E eu não gostava de pessoas me tocando. Inclusive quando eu não vestia nada.
-Saia da minha frente Nicolas, preciso de água. –Falei, enquanto o empurrava para o lado, tentando entrar no pequeno quarto com o chuveiro.
Fechei a porta com pressa, tranquei-a e corri para o banho.
A água estava gelada. As gotas caiam curiosas em minha pele, me cortavam com a baixa temperatura.
-Não vai querer saber minha historinha? Ou o trato já esta desfeito e você jogou sem querer algo em troca? Aposto que está morrendo de curiosidade.
Eu queria saber. Eu estava louca, morta, com um universo e meio de curiosidade de remexendo dentro de mim. Não queria que Nicolas percebesse.
-Claro que quero saber.
Ele estava do outro lado da porta. Devia estar forçando a fechadura para entrar, eu tinha certeza de que ele não gostaria de ficar do lado de fora. Não queria que ele entrasse. Poderia contar de onde estava.
-Não vai abrir a porta?
-Não. Conte-me de onde está. E ande logo, conte enquanto estou de pé, pois já já me deito.
-Já que quer assim... –Ouvi passos se distanciando. Como era sacana.
-Pare de suspense Nicolas. Sei que ainda está com a orelha colada na porta.
Ele soltou um palavrão abafado e depois riu alto para disfarçar.
-Vejo que está cada vez mais esperta, querida Íris. Acredito que grande parte dessa esperteza seja de minha influencia.
-Sendo sua ou não, não ligo. Apenas me conte o que aconteceu.
-Está bem. Mas antes eu arrumaria algum lugar para sentar. Você está prestes a ouvir uma longa historia. Cuidado com os pesadelos, minha pequena.
Sentei no chão, sob a água. As gotas quicavam em meus ombros, molhavam meu cabelo. Faziam um som infantil. As palavras se derretiam, amargamente doces. Eu chegava a sentir o gosto. Adorava historias.
-Destino chegou cedo hoje, bem antes de você acordar. Ainda havia lua no céu - Assim Nicolas começou, narrando cuidadosamente sua historia.
-Quando abri os olhos, acordado por um frio repentino, vi seu vulto negro sentado no chão. Demorei para levantar-me, pois você me abraçava, e eu não queria te acordar. Mas como você me segurava forte! Levantei-me e fui em direção de Destino. O ar chegava a fazer mais barulho que nossas vozes em meio a uma conversa.
“Em um momento, quase começamos a gritar. Destino e eu não nos entendemos muito bem, devíamos estar discutindo por alguma bobagem. Tão bobagem que nem me lembro agora. Quando começamos a levantar a voz, ele me segurou pelo braço e me puxou para fora da casa. O ar me cortava. Andamos durante bastante tempo, rumo à uma floresta. Destinou usou um caminho difícil, dando voltas e andando rápido, fazendo com que eu não me lembrasse de como voltar.”
-Então você não foi dar uma volta?
-Deixe-me terminar, Íris!
“Certo. Bem, depois de tanto andar, acabamos chegando a uma clareira na floresta. Destino me olhou com ódio, e me bateu uma primeira vez.
“Sempre imaginei Destino como um velho. Mas seus punhos eram duros como aço, e estavam mais frios do que a noite, me cortavam. Ardiam e queimavam. Nunca um soco doeu tanto. E era uma dor que não acabava.
“Começou um longo sermão. Destino adora falar, adora que prestem atenção em suas palavras difíceis e em seus enigmas.
“Primeiro ele me disse coisas sem sentido, sobre leis, contratos, acordos. Falou que eu estava contra tudo e todos, que eu era um rebelde. Eu não entendia nada. As palavras não faziam sentido, e eu ainda estava tonto de dor.
“Foi então que olhei diretamente para Destino, e prestei atenção em sua figura.
“Ele estava sem capa Íris, sem nada. Eu pude ver seu corpo branco e enrugado. A pele fina, como papel. Eu podia jurar que, com o minimo movimento, ele se ragaria. Mas ainda assim parecia esculpido em pedra.
“Destino me olhou, mas eu já não prestava atenção. Me bateu novamente, eu sentia mais dor. Parecia que Destino ia arrancar meus braços.”
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Não sei como ainda não indiquei Beirut. É um estilo meio folclorico e muito alternativo. Vale escutar Nantes e Elephunt Gun.